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segunda-feira, 16 de dezembro de 2013



PRESTA ATENÇÃO


        Presta atenção no que vou dizer:
se amanhã eu não acordar
E se esta noite for de um negrume eterno
diga a todos que eu morri de amor
sufocado nos secos ramos arborizados do meu pensamento
entre as letras do nome da minha amada
à espera do sol, de sal E do sul

Diz à minha amada que fui fiel
apesar das tórridas lágrimas ruborizadas
aos choros ameninados nas sibéricas madrugadas

Pois, a jornada dos frustrados chegou a mim
esfacelado na engrenagem do amor

Rendo-me ao revés da rejeição.




sábado, 23 de novembro de 2013




Vendo a lua cheia, ameixa dourada
só agora, sinto o quanto vivo só
de tantas viagens, de tantas viragens 
de terras E prantos, de chuvas E invernos,
só agora, sinto brotar a solidão pelas raízes
da pele escalavrada, da alma esvaziada
sinto o coração ardendo de desejos
mas nada resta senão essa dor de estar só!




quinta-feira, 24 de outubro de 2013


 OUTUBRÂNCIA DE PÉTALAS


A outubrância de pétalas,
O sabor terroso das minhas insípidas lágrimas,
A triste dor que dilacera o coração,

as teias do Outono alaranjado,
a ponte que rouba a luz dos meus sentidos
o veneno milagroso que amacia a madrugada
o segredo que escorre dos olhos de quem amo
a chuva que repassa os gânglios do telhado
os versos debruados em rochedos requebrados
outubro-me para aliviar a dor

Prensado entre o sol E a lua
besuntado de cinza E desafectos
acastelando sonhos arenosos
que tomam de assalto os meus sentidos

Neste Outubro afunilado
pediram-me para ser
o príncipe da terra santa
mas prefiro ser folha seca de Outono
navegando ao sabor do vento
ao avesso das girândolas luminosas
deste vida que é efémera E vazia.



domingo, 6 de outubro de 2013

Mágoas


O que mais plantei na vida
foram lágrimas
adubando a terra
onde me sepulto ao pôr do sol

guardo as minhas mágoas
porque ninguém as quer

Mágoas de me ver
coração extenso de abismos
sonhos inacabados, gestos adiados

em todas as esquinas de mim
o sol é uma lua de Inverno
o azul do céu é luto nos rostos
que se cruzam comigo
no tabuleiro da vida

Mágoas que sinto
góticas açucenas
que ensombram a minha memória
respigando cinzas na minh`alma

mágoas de me ver
na alma dos pobres
no olhar agastado do velho tísico
dos jornais ensanguentados

a dor enche-me de mágoas
as mágoas enchem-me de lágrimas
que se misturam com a terra
onde me apago ao pôr-do-sol.



quarta-feira, 18 de setembro de 2013



Posso tudo

Se eu pudesse apagar o meu medo
varrer os recônditos da minha memória engessada
agitar as águas do tanque de Betesda
E ser-me em esplendor 

Se eu pudesse ter domínio dos meus sonhos
das palavras que distorcem  a vontade
E guardar dos que me querem mal
a virtude E o caracter de homem bom

se eu pudesse trocar toda a ambição que me invade
pelo simples fogo de lenha do pobre
preservando a pura poesia que aprendi do Senhor

Se eu pudesse esquecer tudo o que aprendi
E perder-me nas horas descontinuas de uma flor perfumada
sentindo o gosto da terra que pisei na infância
reinventar o poente para enterrar a dor
entre rochedos E ervas E nascer de novo…

Por mim mesmo não
mas posso tudo Naquele que me fortalece!






sexta-feira, 30 de agosto de 2013



A mulher que eu procuro

Tenho procurado por ti
em outros rostos femininos
olhos lilases de um crepúsculo distante
lábios à vela singrando meus anseios
caracóis ondulantes de folhas ao vento
teus seios, um areal de sonhos
a tua pele morena calcorreando as ruas de Espargo
nuvem  dourada ao sabor do vento
a tua fonte escura é de água cristalina


todas as mulheres trazem teus traços:
duas uvas incandescentes
duas laranjas de coroas acobreadas
duas estações ajustadas aos quadris
E o misterioso véu que cobre os teus segredos!

Todas trazem teus traços
mas nenhuma se compara ao teu encanto feminino
que faz arder o amplo estuário da paixão
como as ondas rebeldes do mar de Fiúra




domingo, 7 de julho de 2013

EU MORTO



um lugar onde o sol repousa mais cedo
um atalho por onde as lágrimas caminham depressa
um par de asas voando no escuro
uma sombra invisível inerme
meu eu que se esvai
a luz dos meus olhos que se apaga

morro com as palavras em silêncio
afogadas no lago
onde apodrecem
as minhas lágrimas de arrependimento
por ter amado uma vez na vida.


domingo, 14 de abril de 2013

O menino que atirava pedras

Quando eu era criança
atirava pedras que se transformavam em flores
em pleno voo
pedras que musicavam poemas
da terra-boa escalavrada

eu espalhava pedras desenhando quarteis
tesouros, paiol de rosas E açucenas
rendilhadas a ouro
ideograma de pedras rubicundas
substanciadas em romarias
pedras do menino fazendo arte
um horto de alma, um porto de calma

envelheci com o tempo
meus irmãos perderam-se em aventuras
o mundo continua em voltas tresloucadas E decadentes
mas as pedras incólumes
ainda lá estão E guardam a imagem
do menino que atirava pedras.

sexta-feira, 15 de março de 2013


Rosário

Enquanto esperas por mim
conta as estrelas
Enquanto a lua cresce em teu olhar 
aduba o vergel de beijos açulados
para me rasgar ao meio


E neste desejo incomensurável
de me ver perto, de nunca mais me ver
de me amar, de me odiar afanosamente
faz doer-me a alma que se esvai em cinzas

Conta as estrelas
mas não conta o teu segredo ao vento
o doce desejo de te ver em mim
mas sempre duvidosa
poluindo a terra com interrogações…


Lisboa, Março de 2013

domingo, 17 de fevereiro de 2013


SÓS



Estávamos sós.
A madrugada uniu os nossos corpos
o amor uniu os nossos lábios
os eternos momentos que vivemos
eram gotas de ouro bordejadas de suor

a tua voz eram reguengos de luzes
ténues véus de júbilo que atiçavam meu desejo
de te amar, de te beijar
de me sentir dentro de ti

Estávamos sós.
Discutimos aleivosamente
trazendo à memória as nossas fraquezas
coroando de raiva o nosso ciúme
incendiámos a floresta encantada
infernizámos o paraíso
E, até hoje, vivemos caídos na solidão

Continuamos sós.
Presos ao corrosivo orgulho que nos esmaga
curtimos a mágoa de sermos inquebráveis
enfraquecidos E sucumbidos à nauseante vaidade
de não voltar atrás
envelhecidos
despedaçados
atropelados
 pelo ódio de não querer o que mais amamos!

Fevereiro, 2013








Poemas inéditos

a poesia escreve-se com letras conjugadas mas o bom da poesia está nos olhos de quem a interpreta